quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Entrevista de Daniel Viana, por Ester Gonçalves

A paixão pelo café pode ir além da degustação. O crescimento do mercado de cafeterias finas demanda baristas qualificados. Para saber como se destacar, a aprendiz Ester Gonçalves entrevista o premiado Daniel Viana



      Foi-se o tempo em que um trajeto profissional de sucesso se limitava a áreas como engenharia, medicina ou direito. Com o mercado à procura de trabalhadores cada vez mais especializados, sai-se melhor quem investe no que gosta, seja em que ramo for. Um exemplo de carreiras que fogem à regra é a de barista, que, mesmo sendo razoavelmente nova no Brasil, desperta grande interesse por causa da expansão de cafeterias finas pelo país. O especialista que usa o café para criar receitas pode atuar em lanchonetes, restaurantes, hotéis, eventos e festas. Para dar o pontapé inicial, é preciso ter paixão pelo grão, interessar-se pelo processo de produção, querer desvendar sabores e aromas. Além disso, são requisitos ter criatividade e bom paladar para saber como agradar ao cliente e se diferenciar dos demais. Primeiro lugar na etapa Centro-Oeste do Campeonato Brasileiro de Barista 2010, Daniel Viana concedeu entrevista à aspirante Ester Gonçalves, que fará o curso para entrar no quadro de funcionários do Coffee Co. “O reconhecimento para o barista vem por meio do seu esforço, do seu estudo, do cliente começar a frequentar a sua cafeteria”, explica Daniel. Entenda melhor a profissão do barista na entrevista a seguir.

Ester: Como você se interessou por essa área?

      Daniel: Minha mãe é proprietária da Morada Mineira, e meu interesse veio da busca por colocar um bom café aqui. Para ser sincero, eu não me interessava. Mas comecei a pesquisar e acabei fazendo o curso de barista. Depois disso, apaixonei-me e nunca mais quis largar.

Qual café vocês utilizam aqui?

      Café Cristina, da cidade de Cristina, no sul de Minas.

Você sabe onde é fabricado o melhor café do Brasil? Qual a região tem um clima mais propício (para a produção)?

      Cada região oferece um sabor diferente. Eu gosto muito do café do sul de Minas, é o meu preferido. Mas eu já tomei cafés maravilhosos de São Paulo, do cerrado mineiro, do Espírito Santo, da Bahia. Então, o que conta é o trabalho do produtor, muito mais do que o terroir. O terroir te dá um sabor diferenciado, mas é o produtor que consegue fazer esse sabor ficar bom no café.

Você já visitou uma plantação para ver como funciona a moagem do café?

      Já fui a fazendas no cerrado mineiro, algumas no sul de Minas, e é tudo muito bonito. Na fazenda, você se apaixona ainda mais porque conhece o processo de plantação, o cuidado que eles têm com o café. Mas o processo de terroir pode ser feito em qualquer lugar, não necessariamente na fazenda.

Quais são os desafios da profissão de barista?

      São muitos desafios. O primeiro deles é que o curso de barista é muito básico para quem quer trabalhar. Geralmente, as pessoas que gostam de tomar café é que procuram o curso. O grande desafio é pegar essa base, estudar mais, conseguir um bom lugar — trabalho ou estágio —, com alguém que possa te ajudar bastante a crescer na profissão. Você gostar de café e estar interessado na área são só o começo. É necessário estudo e dedicação.

Você percebe uma mudança de modo de ver o café depois de conhecer as áreas prática e teórica?

       Eu não enxergava o café, essa é a verdade. Porque eu não gostava de café, não tinha a cultura de beber café todos os dias. Só me apaixonei quando comecei a estudá-lo e passei a entender o trabalho por trás dele, a degustar vários tipos de terroir, de moagem, de extrações.

Qual o clima perfeito para se cultivar o café?

      O café deve ser plantado no clima quente e úmido. Mas, na hora de secá-lo, o ideal é que o clima seja seco. Então, é complicado: você não tem um terroir, um clima ideal para o café. No sul de Minas, por exemplo, o clima é quente e úmido. E, na hora de torrar, continua quente e úmido. Então, é preciso descascar o café, para não ter perigo de fermentar. No cerrado mineiro, porém, é o contrário: o clima é seco e na secagem continua seco. Isso é incrível porque muda os sabores do café. Você acaba conhecendo o café pela terra, pelo clima da região, pelo cuidado do produtor, pela forma como ele secado. Você vai aprender tudo isso no curso.

E o que se aprende de prático no curso?

      Eles ensinam técnicas de extração de um bom expresso e de vaporização de um bom leite, que são a base de todo barista. É incrível como em Brasília é difícil encontrar profissionais que saibam trabalhar bem o leite. Acabam estragando as bebidas. Se você souber fazer um bom expresso, regular o moinho e preparar um bom leite, já será um ótimo barista. Daí para frente, é só treinamento.

A profissão de barista já é regulamentada?

      Está em processo de regulamentação. Acho que passou por uma comissão do Senado agora. Eu espero que o seja nos próximos meses. Mas é um passo muito pequeno, porque o reconhecimento vem por meio do seu esforço, do seu estudo, do cliente começar a frequentar a sua cafeteria.

Como você enxerga a área do café aqui em Brasília? Acredita que é um segmento que tende a crescer?

      O café em Brasília está muito desenvolvido. São muitas cafeterias com máquinas boas e café de qualidade. O que faltam mesmo são bons baristas, eu conheço poucos. Se tivesse um barista em cada cafeteria seria o ideal, mas é complicado.

Aqui na Morada Mineira, os funcionários são todos baristas ou só você é ?

      Aqui na Todos são treinados por mim, mas ainda assim percebo problemas. Porque o perfil do barista é de uma pessoa jovem, que mexe muito na internet, antenada, e o perfil de atendente é diferente: são pessoas que não têm o nível cultural elevado, até por causa do salário e de todas as dificuldades que têm na vida. Então, é complicado você passar essa cultura do café, esse cuidado que temos que ter, para os atendentes. O ideal seria um barista em cada cafeteria para supervisionar.

Você acredita que há uma técnica para se tirar o café perfeito?

      Tem o padrão, ensinado no curso. Mas depois que você o conhece vai fugindo dele. Vai pesquisando, vendo formas de mudar o sabor: isso que é bom de ser barista. Você pega o mesmo café, a mesma máquina e consegue extraí-lo de várias formas, do jeito que quer servir para o seu cliente. O mesmo café pode ser servido mais ácido ou mais encorpado. Há um padrão a ser seguido, mas você não precisa trabalhar naquela linha.

Qual a mensagem que você deixaria para quem quer ser barista?

      O primeiro passo para ser um bom barista é a paixão. Seja apaixonado pelo que você faz. Se faz tudo com o coração, com certeza será um ótimo profissional. O café em Brasília está muito desenvolvido. Mas faltam bons baristas. Se tivesse um barista em cada cafeteria seria o ideal, mas é complicado.


Matéria do ADMITE-SE.COM.BR
10/01/2011

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